Pêndulo reversível

O pêndulo reversível consiste de uma barra rígida de metal na qual podem ser posicionadas duas massas móveis (figura 1). O pêndulo reversível possui duas cunhas (cutelos) que podem ser apoiadas sobre uma superfície para que oscile com atrito mínimo.

Uma das massas (a vermelha) é mantida fixa enquanto a outra (a verde) é colocada em diferentes posições ao longo da barra. Para cada posição, o período de oscilação do pêndulo é medido na situação "direta" (a massa fixa acima da móvel) e na situação "reversa" (a massa fixa abaixo da móvel). O objetivo é encontrar a posição da massa móvel que faz com que os períodos de oscilação nas duas situações sejam iguais. Conhecido esse período $T$, é possível determinar o valor da aceleração da gravidade usando a relação:

$$ T = 2 \pi \sqrt{ \frac{\ell_0}{g} } $$

onde $\ell_0$ é a distância entre os dois pontos de apoio e $g$ a aceleração da gravidade. Note que essa é a equação para o período de um pêndulo simples de comprimento $\ell_0$.

Este pêndulo foi desenvolvido em 1817 por físico e militar britânico chamado Henry Kater. Kater utilizou um procedimento levemente modificado para medir a aceleração da gravidade local com uma precisão muito maior do que a obtida com um pêndulo simples (KATER, 1818). Para se ter uma ideia dessa precisão, Kater mediu a distância entre os pontos de suspensão com um micrômetro com uma precisão de 2,5 μm e teve que levar em conta correções dos efeitos da dilatação térmica devido a variações na temperatura, dos efeitos da pressão atmosférica no empuxo sobre as massas, e da altitude para levar em conta a distância ao centro da Terra.

Como explicam Victor F., Lenzen e Robert P. Multauf (LENZEN e MULTHAUF, 1966) o pêndulo de Kater é colocado à frente de um relógio de pêndulo cujo prumo está diretamente atrás da extensão na extremidade do pêndulo de Kater. Uma marca branca é pintada no centro do prumo do relógio de pêndulo. Uma luneta de observação (à esquerda na figura) tem um diafragma com uma fenda vertical de largura tal que a vista seja totalmente preenchida pela extensão na extremidade do pêndulo de Katar quando em repouso. Quando os dois pêndulos estão oscilando, a marca branca no prumo do relógio de pêndulo pode ser vista em cada oscilação, exceto naquela em que os dois pêndulos estão em coincidência.

O pêndulo reversível e a técnica de Kater foi a metodologia padrão para a medida da aceleração da gravidade local até 1930 e hoje é apenas utilizada para experimentos didáticos sobre os diferentes tipos de pêndulos, como acontece no Laboratório de Mecânica, Termodinámica e Acústica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC, 2017).

O objetivo da aquisição de dados é fazer um gráfico como o que segue e obter dele o período do pêndulo simples equivalente ao pêndulo reversível do experimento. Esse período é obtido traçando-se uma curva estimada sobre cada conjunto de dados experimentais e lendo o período associado ao ponto de intersecção delas.

No caso do conjunto de dados apresentado, obtidos com o simulador, foram feitas medidas variando-se a massa de aproximadamente 2,0 em 2,0 cm (com um erro de escala de 0,5 cm) e medindo-se o tempo de 10 oscilações (com um erro de escala de 0,01 s) em cada situação (direta e reversa).

Como pode ser estimado do gráfico, o período associado à intersecção é de aproximadamente 2,02 s, correspondendo a uma aceleração da gravidade de 9,68 m/s2. Empregando-se os valores exatos utilizados na simulação, o período seria de 2,008 s e a gravidade 9,792 m/s2. Desse modo, o valor encontrado difere do valor de referência por aproximadamente 1,14%.

A figura a seguir representa um objeto (corpo rígido) que servirá de modelo para a análise do movimento do pêndulo composto.

Imagine um eixo que passa perpendiculrmente pelo ponto ponto de suspensão S, em torno do qual o objeto pode girar livremente. O centro de massa do objeto está no ponto C, que está a uma distância d do ponto de suspensão. O centro de oscilação O é um ponto especial sobre o prolongamento da reta que passa por S e C. Se pendurado por esta ponto, o objeto oscila com a mesma frequência que oscila quando pendurado pelo ponto S.

A figura representa um instante do movimento oscilatório em que a linha imaginária entre os pontos S e O faz um ângulo $\theta$ com a vertical. O movimento é provocado pelo torque devido à gravidade agindo sobre a massa m do objeto, que é dado por:

$$ \tau = - m g d \sin \theta $$

O torque, por definição, provoca uma aceleração $\alpha$ em um objeto com momento de inércia I:

$$ \tau = I \alpha = I \frac{d^2\theta}{dt^2} $$

Juntando as duas equações e manipulando os termos obtemos:

$$ \frac{d^2\theta}{dt^2} + \frac{m g d}{I} \sin \theta = 0 $$

Não é possível encontrar uma solução analítica para esta equação diferencial. Entretanto, para ângulos pequenos o seno do ângulo é aproximadamente igual ao ângulo (em radianos):

$$ \sin \theta \simeq \theta $$

Utilizando essa aproximação (para pequenas oscilações), a equação diferencial pode ser escrita como:

$$ \frac{d^2\theta}{dt^2} + \frac{m g d}{I} \theta = 0 $$

Uma possível solução analítica para essa equação, adequada ao nosso problema, é:

$$ \theta = \theta_0 \cos(\omega t) $$

onde a $\theta_0$ é o ângulo associado à amplitude inicial (em t = 0) e $\omega$ é a frequência angular do movimento, dada por:

$$ \omega = 2 \pi f = \sqrt{ \frac{m g d}{I} } $$

a partir da qual calcula-se o período T:

$$ T = \frac{1}{f} = 2\pi\sqrt{\frac{I}{m g d}} $$

[Nota: essa expressão pode levar a crer que o período de oscilação do pêndulo físico depende da sua massa, diferentemente do que acontece com o pêndulo simples, cujo período não depende da massa. Entretanto, se lembramos que o momento de inércia de um corpo qualquer em relação a um eixo qualquer é sempre dado por $I = kma^2$, onde $m$ é a massa, $a$ uma dimensão característica do sistema e $k$ uma constante adimensional que depende da distribuição de massa e da posição do eixo de rotação, vemos que as massas no numerador e no denominador se cancelam.]

Eventualmente pode ser interessante trabalhar com o conceito de um pêndulo simples equivalente ao pêndulo físico. O período de um pêndulo simples de comprimento $\ell_0$ é dado por:

$$ T = 2\pi\sqrt{\frac{\ell_0}{g}} $$

Igualando as equações para os períodos do pêndulo físico e do pêndulo simples, obtemos o comprimento do pêndulo simples equivalente ao pêndulo físico em termos do seu momento de inércia e massa:

$$ \ell_0 = \frac{I}{m d} $$

Essa distância é exatamente a distância que separa o ponto de suspensão $S$ do centro de oscilação $O$, pois, pois o ponto $O$ foi definido como o outro ponto pelo qual o pêndulo físico pode ser suspenso e posto a oscilar com o mesmo período que oscila quando suspenso pelo ponto $S$.

No experimento que você vai realizar o valor de $\ell_0$ é dado (os dois pontos de suspensão são fixos), vai variar a distribuição de massa e medir os períodos na situação direta e reversa para encontrar o período. A partir do período $T$ na condição de reversibilidade e conhecida a distância $\ell_0$ entre os pontos de suspensão, é possível determinar a aceleração da gravidade:

$$ g = \frac{4\pi^2\ell_0}{T^2} $$

O uso do simulador do pêndulo reversível é para ser bastante óbvio.

A primeira coisa que você deve fazer é medir a posição da massa móvel (verde). Para isso, clique no botão "MEDIR". Isso mostrará uma escala em centímetros sobre o pêndulo. Você poderá utilizar a barra deslizante à direita para ajustar a posição da massa ou as teclas de setas do seu teclado.

Note que a menor divisão da escala é de 1 cm (10× menos precisa do que a de uma trena, cuja menor divisão de escala é de 0,1 cm) e, portanto, o erro de escala é de 0,5 cm. Entretanto, de propósito, tanto a barra deslizante quanto as teclas de setas oferecem um intervalo dinâmico um pouco maior que esse, de modo a introduzir uma incerteza na determinação da posição.

Caso você ache conveniente, poderá fazer a leitura em uma escala ampliada, que você pode obter utilizando a combinação de teclas CTRL++. Depois de ficar satisfeito com sua medida da posição e anotá-la em um papel, pode utilizar CTRL+ para retornar à escala original e prosseguir com o experimento.

Feita a medida, pressione o botão "PREPARAR". Esta ação zera o cronômetro e posiciona o pêndulo em um ângulo de cerca de 15 graus com relação à vertical. Em seguida, pressione "SOLTAR", o que vai fazer com que o pêndulo comece a oscilar e disparar o cronômetro (note que isso o exime de um dos possíveis erros sistemáticos no experimento real, associado ao reflexo de iniciar o cronômetro).

Pare o cronômetro quando o número desejado de oscilações completas (ida e volta) for executado. Como o tempo de reflexo de um ser humano é da ordem de 0,2 segundos e a menor devisão de escala de um cronômetro é em geral de 0,01 segundos, cronometrar o tempo de 10 oscilações e dividir o resultado por 10 leva a uma precisão da ordem de centésimos de segundos (0,001 s).

Altere a situação do pêndulo para "reversa" e meça o período das oscilações usando o mesmo critério da medida em situação "direta".

Altere a posição da massa móvel e refaça as medidas do período na situação "direta" e "reversa". Note que como as curvas estimadas serão traçadas "à mão" (isto é, sem a ajuda de um procedimento matemático bem definido), é interessante que os seus traçados, particularmente no ponto de intersecção, sejam definidos por uma "tendência" mais global do que local (que devido à imprecisão das medidas pode introduzir grandes erros).

Distância entre os pontos de suspensão
$\ell_0$ = 100,00 (± 0,05 cm)

Número de oscilações

  d
(± 0,5 cm)
Direto Invertido
$t_D$
0,01 s)
$T_D$
0,001 s)
$t_I$
0,01 s)
$T_I$
0,001 s)

Ao clicar aqui o seu navegador abrirá uma nova aba para você fazer os gráficos a partir dos pontos da tabela.

Esse aplicativo não faz isso automaticamente justamente para que você exercite o seu discernimento a respeito da definição das escalas, nomes e unidades dos eixos, algarismos significativos dos rótulos das escalas, colocação dos pontos, traçamento de curvas etc.

O uso é bastante intuitivo:

direto
reverso











0.0

Esta simulação foi inspirada no equipamento e na metodologia utilizados nos disciplinas experimentais oferecidas pelo Laboratório de Mecânica, Termodinâmica e Acústica do Departamento de Física da Universidade Federal de Santa Catarina.

Modelos de pêndulos de Kater semelhantes ao simulado neste trabalho (SCIENCE FIRST, 2017; BRAGA, 2014).

O equipamento consiste em uma haste retangular com cerca de 1,5 m de comprimento, ao longo da qual podem ser posicionadas duas dois discos cilíndricos. Simetricamente dispostos na haste encontram-se os pontos de suspensão, separados por uma distância de 1 metro. Uma das massas pode mover-se entre os dois pontos de supensão, enquanto a outra entre a extremidade da haste e um dos pontos de suspensão.

O cálculo do período em uma configuração arbitrária das massas requer o conhecimento do momento de inércia do pêndulo em relação ao ponto de suspensão. O momento de inércia total do pêndulo ($I_T$) é a soma dos momentos de inércia dos seus constituintes (uma haste retangular e dois discos cilíndricos). Os momentos de inérica da haste ($I_H$) e dos discos ($I_A$ e $I_B$), relativamente a um eixo que passa através seus centros de massa são dados por:

\begin{eqnarray} I_H & = & \frac{1}{12} m_H (a_H^2 + b_H^2) \\ I_A & = & \frac{1}{2} m_A r_A^2 \\ I_B & = & \frac{1}{2} m_B r_B^2 \\ \end{eqnarray}

O teorema dos eixos paralelos permite calcular o momento de inércia ($I_D$) de um corpo em relação ao um eixo paralelo ao centro de massa e a uma distância $D$ dele, conhecido o seu momento de inércia em relação ao centro de massa ($I_{CM}$) e a sua massa total ($M$):

$$ I_D = I_{CM} + M D^2 $$

Se $y_H$, $y_A$ e $y_B$ são as distâncias entre o ponto de suspensão e os centros de massa da haste e dos cilindros e $m_H$, $m_A$ e $m_B$ suas massas, o momento de inércia total ($I_T$) e a massa total ($m_T$) são dados por:

\begin{eqnarray} I_T & = & (I_A + m_A y_A^2) + (I_B + m_B y_B^2) + (I_H + m_H y_H^2) \\ m_T & = & m_A + m_B + m_C \\ \end{eqnarray}

Finalmente, a distância entre o ponto de suspensão e o centro de massa ($d$) e o período de oscilação ($T$) são dados por:

\begin{eqnarray} d & = & \frac{ m_A y_A + m_B y_B + m_C y_C }{ m_A + m_B + m_C } \\ T & = & 2 \pi \sqrt{ \frac{I_T}{m_T g d} } \\ \end{eqnarray}

A tabela a seguir mostra os valores dos parâmetros utilizados na simulação.

Em um sistema realista a amplitude de oscilação do pêndulo vai diminuindo devido ao atrito com no ponto de suspensão e com o ar. Essa redução da amplitude é modelada utilizando uma atenuação exponencial $\exp(-bt)$, onde $b$ é o coeficiente de atenuação. A simulação utiliza um valor de $b$ para o qual passados 50 s a amplitude da oscilação é 1% da amplitude inicial, quando o movimento é praticamente imperceptível e a simulação é desligada automaticamente.

Por motivos técnicos (em última análise, computadores só trabalham com números inteiros), na simulação as posições escolhidas visualmente pelo usuário para o disco cilíndrico móvel só podem assumir valores discretos. Para simular a arbitrariedade do usuário na leitura da escala, a simulação adiciona ao valor escolhido uma flutuação aleatória a partir de uma distribuição de probabilidades uniforme com uma largura igual à metade da menor divisão da escala.

Propositalmente, na simulação, o movimento da barra deslizante que controla a posição do disco móvel se dá em passos de 0,001 m (1 mm), menor que a incerteza na leitura (a menor divisão da escala é de 0,01 m (1 cm), que leva a uma incerteza de escala (definida aqui como a metade da menor divisão da escala) de 0,005 m (0,5 cm ou 5 mm). Para introduzir algum grau de aleatoriedade que simule a arbitrariedade da leitura da posição pelo observador, a simulação adiciona (para mais ou para menos) 0,5 cm de incerteza (utilizando um gerador de números aleatórios que obedece a uma distribuição univorme) ao valor escolhido para a posição do disco móvel.

Por exemplo, considerando figura ao lado, se a simulação registrou a posição escolhida pelo usuário com o mouse ou teclado como sendo (exatamente) 0,316 m (31,6 cm), em seguida introduziu uma flutuação tal que o valor realmente utilizado nos cálculos estará entre 31,1 cm e 32,1 cm, com igual probabilidade.

AMRITA Vishwa Vydyapeetham University. Kater's pendulum. http://vlab.amrita.edu/?sub=1&brch=280&sim=518&cnt=1. Acessado em 15/06/2017.

BRAGA, R. Renato Braga. Damiano, Federico and me in experimental physics class on Kater's Pendulum. https://www.youtube.com/watch?v=oNBFwVQAVVU. Acessado em 15/06/2017.

BRITTANICA. Kater’s pendulum. https://www.britannica.com/technology/Katers-pendulum. Acessado em 15/06/2017.

KATER, H. An Account of Experiments for Determining the Length of the Pendulum Vibrating Seconds in the Latitude of London. Phil. Trans. R. Soc. Lond. January 1, 1818 108 33-102; doi:10.1098/rstl.1818.0006. http://rstl.royalsocietypublishing.org/content/108/33.citation. Acessado em 15/06/2017.

LENZEN, V. e MULTHAUF, R. P. Development of Gravity Pendulums in the 19th Century Contributions from the Museum of History and Technology. Papers 34-44 On Science and Technology, Smithsonian Institution, 1966. https://archive.org/details/developmentofgra35024gut e http://www.gutenberg.org/ebooks/35024. Acessado em 15/06/2017.

PERAIRE, J.,WIDNALL, S. MITOPENCOURSEWARE Aeronautics and astronautics Lecture L24 - Penduluns, 2009. https://ocw.mit.edu/courses/aeronautics-and-astronautics/16-07-dynamics-fall-2009/lecture-notes/MIT16_07F09_Lec24.pdf. Acessado em 15/06/2017.

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UFSC. M04 - Pêndulo físico (roteiro de experimento). Departamento de Física, Universidade Federal de Santa Catarina (não publicado), 2017.

WIKIPEDIA. Kater's pendulum. https://en.wikipedia.org/wiki/Kater%27s_pendulum. Acessado em 15/06/2017.